terça-feira, 9 de junho de 2009

Moçambique

Teresa Nunes e José Nunes são um casal de idosos que vivem no mesmo prédio que eu.
Teresa chegou a Moçambique com José e as suas duas filhas em 1956, com 19 anos, tendo sido o seu principal objectivo libertar-se de uma vida do campo.
Como não conhecia ninguém para além do seu marido, o início foi um pouco doloroso e chorava todos os dias. Passados apenas quatro dias, o seu marido consegue um emprego na construção civil e a partir daí tudo começou a ser mais fácil.
Fez amizade com outros portugueses que viviam na mesma zona e, como não havia televisão, os seus tempos livres eram ocupados com cinema, jazz, danças e praia. O mais importante era viver o próprio dia, não pensando no próximo.
As filhas frequentavam a escola, o marido trabalhava na construção civil e Teresa convivia com amigas e amigos, pois, como tinha empregados, não se preocupava muito com as tarefas de casa.
















José, Teresa, as filhas e um casal amigo.

Em 1968, voltou a Portugal para comparar a sua vida com a portuguesa. Rapidamente verificou que não era em Portugal que queria estar e que se sentia bem voltando a Moçambique. Por essa altura, o seu marido tinha conseguido já um emprego na polícia.

Perto dos seus 40 anos, Teresa abriu o seu próprio negócio e tornou-se gerente de uma loja onde vendia de tudo um pouco, desde roupa a alimentação. Tinha também alguns empregados.

"Para mim, a maior riqueza não era o dinheiro, nem os meus bens pessoais, mas sim a minha família e os meus amigos.”

Em Moçambique, havia um avanço em relação a Portugal, no que dizia respeito a produtos alimentares, pois grande parte das frutas eram já parafinadas e embaladas. Como se praticava o Apartheid, uma vez, num supermercado de raça negra, foi advertida de que ali não era bem-vinda.

“Eu sabia que existia o Apartheid e sabia o que era e não concordava, porque participava em movimentos e campanhas de solidariedade, para favorecer os mais necessitados, só que ali não era de facto bem-vinda.”

Mais tarde, Teresa quis matricular as filhas na universidade, para que elas pudessem concluir os estudos. Mas era preciso que já tivessem feito trabalhos cívicos coisa que elas não tinham feito. Portanto, para que as suas filhas pudessem concluir os estudos, em Outubro de 1976, Teresa e José regressaram definitivamente a Portugal.













José e Teresa com um casal amigo.

Hoje em dia, já com as filhas adultas, Teresa e José não levam o mesmo modo de vida que tinham em África. José tem muita dificuldade em esquecer o passado, pois foi em Moçambique que viveu os anos mais felizes da sua vida.

“Eu já não penso nisso, pois vivo o presente e não o passado, mas as minhas filhas andam num psicólogo e o meu marido num psiquiatra, pois têm muita dificuldade em esquecer tudo o que se passou”.


Ivan Dias

A vida na ex-colónia de Angola

Foi no mês de Dezembro no ano de 1963 que Manuel Farromba (meu tio-avô) embarcou num barco de nome NIAÇA, com destino a Luanda – Angola. Ele cumpria o serviço militar obrigatório e com ele encontravam-se mais 3 mil militares. Foi uma viagem de 12 dias sem quais quer condições.O meu tio-avô pertencia ao Batalhão de Manutenção. Este Batalhão era dividido em Pelotões de Assistência Directa (PAD) que tinham cada um a sua especialidade: mecânica de automóveis; mecânica de armas; etc. O pelotão do meu tio era o de mecânica.Quando chegou a Luanda, ficou instalado num antigo armazém de café, que foi transformado em Caserna. Era aqui que dormiam e comiam, sem grandes condições, mas com muitos amigos.Trabalhava a 3 KM da caserna, nas oficinas que estavam dentro da povoação chamada Ambrisete. Os residentes eram famílias simpáticas e os homens, que também cumpriam o serviço militar obrigatório, colaboravam e trabalhavam com eles. O meu tio fez alguns amigos residentes e gostava de os ajudar quando podia.Um dia de Janeiro de 1964, passou pela situação mais difícil da sua vida: estavam a ser atacados com granadas de morteiro a poucos metros deles, que por sorte não rebentaram. Naquela altura, comentaram que as granadas estavam um pouco húmidas e por isso não produziram o efeito esperado. Os atacantes eram os chamados terroristas, que, segundo lhe disseram na altura, queriam acabar com todos os campos militares.Hoje considera que esses invasores eram os angolanos a lutar pela sua independência. Neste dia, ele sentiu muito medo e pensou que podia morrer.De Portugal recebia notícias através do correio normal. Ele, para responder às cartas e mandar algumas fotografias, utilizava, para além do correio normal, os aerogramas, que eram gratuitos para os militares, mas que demoravam mais tempo a chegarA 10 de Dezembro de 1965, regressou finalmente a Portugal e um mês depois passou à disponibilidadade.




















Foto 1 – Convívio durante a viagem, entre os militares.


















Foto 2 – Fotografia tirada em frente à caserna.

















Foto 3 – Refeitório só coberto por um telheiro.























Foto 4 – Algumas famílias com quem convivia.



















Foto 5 – Fotografia tirada quando iam para o mato treinar.
















Foto 6 – Fotografia tirada em treinos, para se prepararem para uma situação de guerra.



Margarida Carvalho

A vida em Angola contada pela minha avó






Os meus tios e outras crianças de Angola.






Generosa Valente da Silva Almeida, a minha avó materna, nasceu, em 1941, em Vila Nova de Gaia. A minha avó foi para Angola, em 1960, com 19 anos de idade, onde conheceu o meu avô Manuel Almeida. Constituíram família e desta união nasceram três filhos, um deles é a minha mãe. A minha avó conta-nos que a vida em Angola era vivida com muitas dificuldades, mas em paz. Os meus avós viviam no interior de Angola, porque o meu avô era maquinista dos caminhos-de-ferro. Por vezes, os comboios paravam por falta de trabalho e o meu avô ficava muito tempo sem trabalhar. A minha avó era doméstica tratava da casa e dos filhos. Apesar de terem pouco dinheiro, davam sempre o melhor que podiam aos seus filhos.



O meu avô, com a farda de maquinista dos caminhos-de-ferro.


Quando se declarou a independência em Angola, a minha mãe era muito pequena. A minha avó veio para Portugal com os filhos, mas o meu avô ficou lá mais 9 meses, debaixo de guerra. Quando o meu avô voltou para perto da família, ninguém pensava que fosse mesmo verdade. Em Portugal, os retornados viviam com muita dificuldade, eram discriminados. O meu avô começou a trabalhar nas fazendas, muitas vezes queriam dar de comer aos seus filhos e não tinham, foi uma batalha muito dura, que todos tiveram de vencer. Quando os meus tios e a minha mãe eram um pouco mais velhos, entre os 12 e 14 anos de idade, tiveram que ir trabalhar para a vindima, para a apanha da azeitona e para o lagar.Ainda hoje a minha avó conta que, passados tantos anos, as pessoas que vieram de Angola para Portugal ainda são olhadas de lado pelas pessoas que naquela altura tinham algumas posses.Os meus avós já cá estão há 34 anos. Se o meu avô fosse vivo, fazia 80 anos, no 25 de Abril.

A minha avó e os meus tios, quando chegaram a Portugal

Mariana Pirona

A Salto

É aqui que começa a história do meu avô paterno, Manuel dos Santos Lopes da Silva. Tal como muitos portugueses, o meu avô emigrou, nos anos 60, para França. Em Março de 1964, decidiu ir a salto, pagando, segundo a minha avó, 30 contos ao passador (guia), homem que ajudava, a troco de uma remuneração, os outros a passar a fronteira. A minha avó lembra-se que ele dizia que os que iam a “salto” eram os “índios”, porque tentavam emigrar, de uma forma clandestina.O meu avô e mais alguns amigos foram de táxi com o senhor António Ramalho, até à fronteira de Vila Formoso. Aí, fizeram o pagamento a um guia espanhol que os esperava e foram a pé, pela calada da noite, correndo riscos não só materiais como físicos.O grupo tinha de 20 homens e 1 mulher, que acompanhava o marido. Em Espanha, estiveram 3 dias fechados num palheiro, onde não podiam fazer barulho e a alimentação escasseava.Finalmente, chegaram à fronteira de França. Já nos Pirenéus, permaneceram 8 dias num casebre, cheio de pulgas. Em França, trabalhou na construção civil. Durante 25 anos, percorreu várias cidades e vilas de França (Paris, Chambery, Grenoble, Remis, Lyon, Alpes Doesse, Deux Alpes…).

O meu avô na construção civil

Fábio Silva

A minha família em Angola

A história da minha família, em Angola, começa há 59 anos atrás, quando o meu bisavô, Manuel dos Santos Pio, decidiu emigrar para o Ultramar, à procura de melhores condições de vida.O meu bisavô recebeu uma carta de chamada, à qual respondeu afirmativamente, e partiram, a 14 de Junho de 1950, rumo a uma colónia, onde tudo era desconhecido, Angola.Chegaram ao porto de Moçâmedes. Era uma belíssima cidade, com marginais largas e bastantes palmeiras, edifícios altos e modernos, esplanadas cheias, …uma nova realidade se adivinhava.Passadas algumas horas, partiram para Sá da Bandeira, onde o meu bisavô tinha o emprego garantido. O meu avô continuou a estudar. Mais tarde, os meus bisavós voltaram à metrópole, mas ele ficou.Em 1962, o meu avô estava a fazer uma nova viagem e a cumprir um novo destino. Foi para Moçâmedes. Como era aventureiro e activo, começou a praticar desporto: futebol, hóquei e basquetebol no Atlético Clube de Moçâmedes. Mais tarde, foi treinador profissional de basquetebol feminino, no mesmo Clube e no Sporting Clube de Moçâmedes.O ritmo de vida social era acelerado. Frequentava, assiduamente, bailes de gala, no Sporting Clube de Moçâmedes. Também ia a todos os bailes de Carnaval e desfilavam pela avenida principal.O cinema também fazia parte dos seus divertimentos. Umas vezes ia ao Impala Cine, que tinha uma esplanada ao ar livre, outras vezes ao Cineteatro Avenida. Gostava muito de ir à praia das Miragens e à Esplanada do Café Avenida. Assistia a todos os ralis que se realizavam na Marginal e corridas de motas.Em 18 de Junho de 1964, o meu avô resolveu vir visitar os pais à Metrópole, onde conheceu a minha avó e lhe pediu namoro. Nessa altura, correspondiam-se por cartas e, a 3 de Novembro de 1965, casaram-se por procuração.Um mês depois, a minha avó embarcou no paquete “Uíge” e foi para Moçâmedes. A 19 de Abril de 1967, os meus avós tiveram o seu 1.º filho. A 12 de Janeiro de 1969, nasceu a minha mãe.Ela frequentou o Colégio Nossa Senhora de Fátima, dirigido por religiosas.A minha mãe lembra-se bem dos pastéis de nata que comiam na Pastelaria Oásis, da praia das Miragens. Esta praia era um “cartão de visitas” desta cidade. As suas águas eram calmas e tinha um areal muito extenso e branco. Fazia a delícia das crianças e dos adultos.Era junto à praia que se realizavam as Festas do Mar, em Março, num recinto airoso onde funcionava a Feira Popular, com barracas de exposições, comes e bebes. Nessas festas, a minha mãe andava no comboio Bebé, havia cabeçudos e gigantones que desfilavam pelas principais avenidas, corridas de natação em mar, corridas de carros na marginal.A minha mãe também se lembra dos gelados Tico Tico, de ver filmes ao ar livre, no Impala Cine, de ir às matinés do Cine Moçâmedes, de ir passear para as “Hortas”. Recordar é viver…e como tal a mãe também me contou que, nos jardins da avenida principal de Moçâmedes, existia um busto de Bernardino Freire de Figueiredo Abreu e Castro (fundador da cidade), o Palácio da Justiça (tribunal) e uma fonte luminosa ladeada por uma elegante gazela. No Parque Infantil Alina Marques de Campos, além dos baloiços, escorregas e outros divertimentos, existiam duas atracções, com as quais as crianças vibravam: a Chica (uma macaca) e o Kaitô (um elefante).Saíram da sua terra, Moçâmedes, em 1975. Uma nova vida ia recomeçar…





















O avô com a minha mãe e o meu padrinho





Fábio Silva